A viagem ao Brasil do presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, custou ao governo federal ao menos R$ 300 mil, entre desembolsos com hospedagem, veículos oficiais e eventos.A despesa total, porém, foi ainda maior. Isso porque os custos do envio de avião da FAB (Força Aérea Brasileira) para buscar o líder estrangeiro e levá-lo de volta ao país africano não foram contabilizados na planilha enviada pelo Itamaraty, após pedido feito com base na LAI (Lei de Acesso à Informação).Os voos da FAB com Embaló entre Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro tampouco foram incluídos na tabela de despesas. Também questionado via LAI, o Ministério da Defesa afirmou que custos que envolvem aviões militares são sigilosos.Embaló esteve no Brasil na semana de 24 de agosto. Ele foi recebido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) --de quem é admirador-- e participou como convidado de honra das celebrações pelo Dia do Soldado.Em 26 de agosto, viajou a São Paulo para visitar o Museu da Língua Portuguesa. No dia seguinte, esteve no Rio de Janeiro para conhecer o Comando de Operações Navais da Marinha.Embaló já foi chamado pelo líder brasileiro de "Bolsonaro da África" e é criticado por promover uma guinada autoritária na Guiné-Bissau. Opositores o acusam de tentar implementar uma ditadura no país.A planilha de custos enviada pelo Ministério das Relações Exteriores com a viagem de Embaló soma R$ 294,2 mil. Desse montante, foram gastos R$ 177,9 mil com eventos e R$ 99,8 mil com hospedagem.A disponibilização de veículos para o africano --o que inclui o aluguel de carros, de acordo com diplomatas-- saiu por R$ 16,4 mil.As despesas abarcam os gastos totais do ministério com a comitiva estrangeira e incluem a estrutura necessária tanto para receber Embaló e seus assessores como para o trabalho de integrantes do governo brasileiro.Na resposta enviada ao pedido de acesso à informação feito pelo jornal Folha de S.Paulo, o Itamaraty destacou que "cortesias oferecidas por governo local a chefe de Estado e chanceler estrangeiro em visita oficial constituem prática de uso corrente observada pela comunidade internacional"."Cumpre ressaltar que, nas viagens ao exterior dos senhores presidente da República e ministro de Estado [das Relações Exteriores], os países anfitriões costumam estender as mesmas cortesias", completa a nota.A chancelaria encaminhou os gastos realizados com duas visitas oficiais realizadas em 2015, a título de comparação. Naquele ano, o Itamaraty desembolsou R$ 153 mil e R$ 171 mil na recepção dos líderes de China e Coreia do Sul, respectivamente.Embora arcar com esses custos seja comum na diplomacia, a viagem de Embaló ao Brasil chamou a atenção pela falta de anúncios e por uma pauta bilateral de pouca substância.Em 2020, o Brasil exportou cerca de US$ 3,4 milhões para a Guiné-Bissau e importou US$ 606 mil do país africano. Diplomatas avaliaram internamente que o encontro foi motivado principalmente pela proximidade ideológica entre os dois líderes.Alexandre dos Santos, professor de África no Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), tem opinião semelhante."Embaló veio fazer turismo ideológico no Brasil. Bolsonaro está isolado e a mesma coisa ocorre com Embaló: ninguém quer uma proximidade com ele na África Ocidental", afirma.A declaração oficial feita por Bolsonaro e Embaló no Palácio do Planalto, em 24 de agosto, durou aproximadamente cinco minutos.Além de chamar Embaló de irmão, Bolsonaro disse que a Guiné-Bissau é a "porta de entrada para a África Ocidental". "Eu considero um país irmão, nós temos muito a colaborar com a Guiné-Bissau e eles também, no tocante a segurança do Atlântico Sul", disse Bolsonaro.Embaló, por sua vez, destacou que o Brasil "tem tudo que a Guiné-Bissau mais precisa" e citou a modernização da agricultura e a área da saúde. "Temos passado por crises cíclicas, e o Brasil nunca virou as costas ao povo irmão da Guiné-Bissau."O comunicado que o Itamaraty soltou sobre a reunião entre os dois líderes tem quatro parágrafos.A nota informou que Bolsonaro e Embaló passaram em revista a agenda bilateral, com vistas a aprofundar o diálogo político e a cooperação técnica entre os dois países."Atualmente, encontram-se em execução projetos nas áreas de agricultura; saúde; capacitação de diplomatas, militares e forças de segurança; alimentação escolar; ensino superior; e gestão de recursos hídricos", afirmou a chancelaria.Mesmo os poucos compromissos oficiais de Embaló no Brasil sofreram desfalques.Ele tentou se encontrar com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). No final, foi recebido pelo vice-presidente do Senado, Veneziano Vital do Rego (MDB-PB).Em São Paulo, chegou a ser agendada um encontro com o governador João Doria (PSDB), mas o tucano cancelou a reunião.Questionado, o Itamaraty informou que Embaló teve ainda outros dois compromissos no Brasil.Em São Paulo, ele manteve "agenda de natureza privada com cerca de 150 membros da comunidade bissau-guineense". E, no Rio, fez uma visita a uma clínica que presta serviços de hemodiálise para o SUS (Sistema Único de Saúde) junto ao ministro Marcelo Queiroga.