O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, assinou nesta quarta-feira (27) um pacote de medidas que chamou de "ambicioso" para enfrentar a crise climática.

As ações atingem fortemente a indústria de gás e petróleo ao proibir novas explorações em terrenos públicos e cortar subsídios de combustíveis fósseis, além de estabelecer uma série de políticas para incentivar a economia de forma sustentável e citar a proteção da floresta amazônica, ponto de divergência  com o governo brasileiro.

"Nosso plano é ambicioso, mas somos americanos. Nós podemos fazer isso, temos que fazer isso e vamos fazer isso", afirmou o democrata."Vemos isso [a crise climática] com nossos próprios olhos. Sentimos isso. É hora de agir."

O plano é um primeiro passo significativo na direção de suas promessas de campanha, que incluíam um pacote de US$ 2 trilhões para incentivar a transição dos EUA para energias limpas, reduzindo as emissões de carbono. Para ser cumprido, o pacote precisa de aprovação do Congresso.

As medidas vão na contramão da gestão de Donald Trump. O republicano buscou maximizar a produção de petróleo, gás e carvão, removendo regulamentações e facilitando aprovações ambientais.

"Na minha opinião, já esperamos muito tempo para lidar com essa crise climática", afirmou Biden, destacando que ameaças como tempestades mais intensas, incêndios florestais e secas estão ligadas  às mudanças climáticas.

Além de suspender novas explorações também em águas públicas "na medida do possível", o presidente determinou uma revisão rigorosa dos contratos de exploração já existentes, de seus impactos climáticos e dos benefícios aos contribuintes.

Os principais impactados pela decisão são estados do Oeste do país, bem como áreas de perfuração no Golfo do México -somadas, essas regiões representam cerca de um quarto do fornecimento de petróleo e gás dos EUA. A medida gerou ainda críticas de alguns estados que dependem da receita de exploração.

A suspensão, porém, não restringe as atividades para geração de energia em terras do governo destinadas a tribos de indígenas americanos.

Para uma produção mais verde, Biden estabeleceu como meta dobrar a produção de energia eólica até 2030.

O democrata instruiu ainda que agências federais devem "eliminar os subsídios de combustíveis fósseis de acordo com a lei". A revisão desses incentivos -que somam bilhões de dólares- para ajudar a financiar o plano de US$ 2 trilhões também era uma de suas promessas de campanha.

Não fica claro, entretanto, quais subsídios poderiam ser retirados -muitos dependem de aprovação do Congresso.

"Não acho que o governo federal deva dar benefícios às grandes petrolíferas no valor de US$ 40 bilhões", disse Biden, referindo-se a estudos que sugerem que a remoção de incentivos fiscais no setor totalizaria esse montante  de receita em dez anos.

O anúncio desagradou a indústria petrolífera, que argumenta que as medidas custarão milhões de empregos e bilhões de dólares em um momento em que a economia americana tem sido fortemente afetada pela pandemia.

O jornal The New York Times afirma que executivos de petróleo, gás e carvão, bem como legisladores republicanos, descreveram os planos de Biden como uma faceta contra a indústria de combustíveis fósseis que pouco fará para reduzir as emissões dos EUA.

As principais empresas, entretanto, adotaram uma abordagem um pouco mais comedida. Em nota, a BP disse que quer trabalhar com o governo para desenvolver "políticas climáticas bem elaboradas".

"Esse é um caso em que consciência e conveniência se encontram", afirmou Biden. "Quando penso em mudança climática e as respostas para isso, eu penso em empregos."

A ordem executiva cria ainda uma Força-Tarefa Nacional do Clima, que tem entre seus objetivos o estímulo a empregos --sem deixar claro como essas vagas seriam criadas.

O texto cita o desenvolvimento de um plano para proteção da floresta amazônica, ao afirmar que, dentro do propósito da medida, os "EUA vão exercitar sua liderança para promover um aumento significativo na ambição climática global à altura do desafio" ambiental. O trecho afirma que a proposta deve envolver outros "ecossistemas críticos que servem para absorver" emissões de carbono.

O presidente americano é crítico da destruição da Amazônia e levou o assunto para sua campanha. Então candidato, afirmou que "a floresta tropical no Brasil está sendo destruída". Jair Bolsonaro criticou a postura de Biden.

A redução dessas emissões é outra questão abordada na ordem. Os EUA são o segundo país que mais emitem esses gases, atrás da China. O plano anunciado nesta quarta é que os EUA neutralizem emissões, no máximo, até 2050.

Nesse sentido, o presidente já havia determinado que a Agência de Proteção Ambiental restabeleça a única política de grande alcance do governo federal para reduzir as emissões de carbono. A regra, da gestão Obama, foi projetada para diminuir a poluição de automóveis e havia sido retirada por Donald Trump.

Mais cedo, o enviado especial para o clima, John Kerry, dissera que irá anunciar, até 22 de abril, Dia da Terra, um novo conjunto de metas específicas para diminuir essas emissões, dentro do que determina o Acordo de Paris.

Nas medidas anunciadas nesta quarta, Biden também estabeleceu novos objetivos de políticas internacionais, especificando que as mudanças climáticas, pela primeira vez, estarão no centro dessa área, bem como de decisões de segurança nacional.

Como sinal de que a questão ambiental estará em todos os braços do Executivo, o Pentágono anunciou que incluirá o risco de mudanças climáticas em simulações militares. Sob Trump, a Estratégia de Defesa Nacional não incluía a questão como uma prioridade.

Na última década, militares e oficiais de inteligência dos EUA desenvolveram um amplo acordo sobre as ameaças à segurança que a mudança climática apresenta, em parte por ameaçar causar desastres naturais em áreas costeiras densamente povoadas, danificar bases militares americanas e abrir novos recursos naturais à competição global.

Apesar das críticas, o pacote teve boa repercussão entre especialistas. "Aplaudimos isso", afirmou Erin Sikorsky ao New York Times. Ele liderou análises de clima e segurança nacional em agências federais até o ano passado e agora é diretor-adjunto do think tank Center for Climate & Security. "[As medidas] nos levam além do que Obama fez."

As mudanças eram também esperadas por grupos de ambientalistas após quatro anos da gestão de Trump, que desacreditava o aquecimento global. "Este é o maior dia para a ação climática em mais de uma década", disse Gene Karpinski, presidente da Liga dos Eleitores pela Conservação, ao jornal americano.