O governo do presidente americano Joe Biden revogou nesta segunda-feira (4) uma regra da administração Donald Trump que proibia que clínicas que recebem verbas federais de programas de planejamento familiar aconselhassem pacientes sobre a interrupção da gravidez.

A nova regra passa a valer no próximo dia 8 de novembro e volta a permitir que centros de saúde que recebem dinheiro do governo federal encaminhem pacientes, quando for o caso, para serviços de aborto. A decisão envolve as clínicas fazem parte do chamado Title X, programa de atenção à saúde voltado para pacientes de baixa-renda.

Essa mudança vem em um momento que as regras que permitem o aborto passam por escrutínio no país, sobretudo depois que a Suprema Corte, agora de maioria conservadora, autorizou a aplicação de uma lei do estado do Texas que proíbe, na prática, a interrupção voluntária da gravidez.

A lei estadual proíbe o aborto após seis semanas de gestação, período em que muitas mulheres ainda não sabem que estão grávidas. Além disso, incentiva que a população denuncie qualquer pessoa que ajude uma mulher a abortar —desde o médico até o taxista que leva a pessoa à clínica— ao estabelecer uma compensação financeira de US$ 10 mil para o autor da queixa.

Outras leis similares começaram a ser discutidas após a aprovação da regra no Texas. Sem lei que permita o procedimento no país em nível federal, o aborto é garantido nos Estados Unidos desde 1973 por decisão da Suprema Corte, em um caso que ficou conhecido como Roe vs. Wade.

O governo do democrata Joe Biden tem ragido e chegou a processar o estado do Texas contra a regra. O presidente americano tem reagido ao que chama de retrocesso e desde que assumiu o mandato já havia adiantado que tentaria mudar a regra do governo Trump que proíbe o financiamento federal de clínicas que encaminhem para serviços de aborto.

Em memorando de janeiro, uma semana após assumir o governo, Biden já dizia que a decisão de seu antecessor colocava a saúde das mulheres em risco.

“As clínicas de planejamento familiar do nosso país desempenham um papel fundamental na prestação de cuidados de saúde e, hoje, mais do que nunca, estamos deixando claro que o acesso a cuidados de planejamento familiar de qualidade inclui informações e referências precisas —com base nas necessidades e orientações do paciente”, disse nesta segunda o secretário de Saúde e Serviços Humanos, Xavier Becerra, em comunicado.

Criado em 1970, o Title X sempre proibiu destinar dinheiro federal para pagar procedimentos de aborto, mas a regra do governo Trump, que entrou em vigor em 2018, proibiu que as clínicas sequer encaminhassem mulheres para outro lugar que fizesse a operação.

A restrição ao encaminhamento para aborto por centros de saúde que têm verbas federais, que começou a valer em 2019, serviu para tirar boa parte do financiamento da Planned Parenthood, maior provedor de serviços de saúde reprodutiva do país, que também faz abortos. O Title X era, até então, o maior financiador da rede, que atende 4 a cada 10 pacientes do programa voltado a pessoas de baixa renda.

Segundo o jornal americano Washington Post, citando dados do Instituto Guttmacher, que pesquisa direitos reprodutivos, a Planned Parenthood saiu de seis estados americanos e fechou 981 clínicas em 2019 no país.

Naquele ano, mais de 20 estados entraram na justiça para evitar a interrupção dos US$ 286 milhões destinados pelo governo federal ao planejamento familiar, sem sucesso.

Dados do governo Biden apontam que cerca de 1,5 milhão de pessoas deixaram de ser atendidas pelo Title X depois da restrição.