O Tocantins, Estado mais jovem do Brasil completa 31 anos, juventude que perpassa aspectos econômicos, políticos, esportivos e principalmente culturais, que definem ou ao menos buscam descrever a diversidade de todo um povo. Expressões artísticas que envolvem música, teatro e cinema compõem essa cultura, porém, o conceito vai além e busca principalmente transmitir, tanto localmente quanto para fora do Estado, a identidade do tocantinense.GeraçõesUm Estado nasce no Brasil em 1988 e com ele um berço de artistas tocantinenses como Mário Igor Vieira Sul, mais conhecido como Mário Xará, músico palmense de 30 anos. Nascido e criado na capital desde sua criação, Sul trabalha com música desde os 18. Nos primeiros anos fez parte de inúmeros projetos musicais locais, entre eles a banda Mestre Cuca, em que atuou como baterista.Prestes a lançar seu primeiro disco solo, com composições próprias de forró alternativo produzidas por ele e com a participação de uma equipe exclusivamente tocantinense, o músico utiliza o financiamento coletivo como forma de recurso para sustentar o seu trabalho.Para ele, a cena musical de bandas e artistas locais está se formando agora, com o surgimento de bandas e a profissionalização e articulação de artistas para se apresentarem em festivais. “Não existe um cenário musical artístico aqui. O Estado é novo, tem gente de todos os lugares, já houve outras efervescências que ensaiassem uma cena. Vejo que isso arrefece, ferventa de novo e agora está esquentando com essas novas bandas”, apontou.A união com artistas de renome e consolidados no cenário cultural do Estado é uma relação fortalecedora que gera um ânimo a mais àqueles que caminham para conquistar seu espaço. “A união dos mais velhos com os mais jovens é algo que nunca tinha acontecido. Dorivã, Braguinha, Genésio, aqueles que eu e boa parte dos meus amigos admiramos muito e não tínhamos contato, hoje a gente já se mistura. Vou na casa deles, cantamos juntos, já até gravei músicas deles”, comentou. EmpobrecimentoPara quem já compõe o cenário artístico há mais tempo, o que se vê é um retrocesso dos fazeres e incentivos à cultura. Meire Maria Monteiro, produtora cultural carioca de 53 anos, veio para o Tocantins no ano de sua criação e já produziu diversas apresentações de teatro, dança e música do Estado, tanto pelo governo quanto de forma independente.Autora de mais de 15 espetáculos, Meire conta que o cenário das artes cênicas no Tocantins está entre um empobrecimento da cultura tradicional e popular do Estado, principal fonte de inspiração para os artistas, e a falta de mecanismos e estruturas para apresentações de espetáculos.“Nós ficamos no meio disso, sem verbas, sem incentivo e sem patrocínio. Tudo que tem sido feito ultimamente basicamente é de forma independente, o que dificulta bastante o artista a estar numa constante produção. As leis de incentivo não funcionam, apesar de existirem. Isso é muito complicado porque não conseguimos formar uma nova plateia e nem incentivar o consumo da produção cultural”, afirmou.Segundo a produtora, o principal gargalo para o desenvolvimento em sua área de atuação é a falta de teatros com condições mecânicas e físicas que comportem espetáculos de alto nível. “É insuficiente um Estado com 139 municípios ter basicamente dois teatros funcionando, que são o Fernando Montenegro e o Teatro Sesc. Nós até tínhamos um outro em Paraíso, mas o teto caiu e ficou por isso mesmo”, pontuou.A cultura como instrumento de transformação na vida dos jovens, que são maioria na população do Tocantins, é um dos argumentos sustentados por Meire. “Não precisa nem raciocinar muito para saber que é preciso incentivar toda essa energia e poder de transformação através desses mecanismos, que além da educação e esportes, também é encontrada na cultura”, finalizou. Cultura popularÉ quase impossível encontrar um só tocantinense que nunca tenha ouvido falar em quadrilhas juninas. A música, a dança e as cores trazidas ao Estado, não só no mês de junho, mas durante todo o decorrer do ano, já estão inseridas na cultura popular e são cada vez mais prestigiadas e amadas por todos.Uma grande contribuição para isso é o Arraiá da Capital, a maior festa junina da região Norte do País. O evento, realizado há 23 anos, reúne mais de 20 quadrilhas e cerca de 1.500 dançarinos em quatro noites de festa. Seu coordenador geral, o produtor cultural Nival Correia, de 45 anos, conta que o envolvimento das pessoas é muito intenso em todo o processo. “O importante da cultura popular é porque ela abrange um número muito grande de pessoas, bem maior do que em outras áreas, principalmente aquelas que têm pouco acesso a informações e produtos culturais”, destacou.Em contrapartida, Correia acredita que, com exceção das quadrilhas juninas, a cultura popular tem que ser aprimorada no Tocantins, principalmente na área da educação. “É preciso trabalhar para que outras fontes de cultura popular como o hip hop, a Jiquitaia, roda de São Gonçalo, congada e a suça, não se percam, que não parem de dançar e cantar aquilo que é do Tocantins”, afirmou.Além de prestar assistência técnica para concursos juninos, os últimos 25 anos da carreira do produtor cultural no Estado já passearam pelo teatro, onde atuou em 14 peças e escreveu cinco, e migraram para o audiovisual em 2014. De lá pra cá, o cineasta trabalhou com séries, documentários e curta metragens para a televisão, um deles o Menina Bonita de Trança, premiado cinco vezes.Para desenvolver seus trabalhos, o produtor afirma que tem mais facilidade de captar recursos fora do Estado, a maioria deles de editais pela Ancine através do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). Correia destaca o fomento e a educação profissional como os principais eixos para se desenvolver cultura através do audiovisual no Tocantins.“Temos bastante conteúdo, vários profissionais, locações incríveis, e muitos cineastas vêm de fora e aproveitam tudo isso, enquanto nós que somos daqui não temos essa mesma facilidade por falta de recursos. Outra questão é a educação profissional a fim de aprimorar nossos artistas para ganharem o mercado cultural com novos produtos genuinamente tocantinenses”, assinalou.OrçamentoOs investimentos aplicados à cultura no Tocantins, atualmente, são provenientes de emendas parlamentares e do Fundo da Cultura. Os recursos que compõem esse Fundo vêm da devolução de recursos de projetos não iniciados ou interrompidos e auxílios e contribuições de entidades públicas ou privadas, nacionais ou internacionais.Além disso, 0,5% da receita tributária líquida, transferências e repasses da União e convênios firmados com a Fundação Cultural do Estado do Tocantins também são destinados para esse fim.De acordo com Tom Lyra, presidente da Agência do Desenvolvimento do Turismo, Cultura e Economia Criativa (Adetuc), os recursos para investimento na cultura não estavam previstos no orçamento do ano passado, o que levou o Estado a tomar algumas medidas na atual gestão, assumida em fevereiro desse ano.“Houve incrementos de recursos, porque quando vimos que ele estava faltando no orçamento, de pronto fomos atrás de emendas parlamentares porque a cultura não podia parar no Tocantins. Então o recurso que tínhamos foi implementado por meio dessas emendas”, afirmou.Para Lyra, a expectativa é que nos próximos anos a cultura dê um salto no Estado e que o próprio Fundo consiga suprir todos os incentivos necessários. “Como o orçamento foi votado no ano passado não tinha como fazermos muito, mas já para o ano que vem conseguiremos desenvolver bastante. Acredito que fizemos muito com o pouco que a gente tinha, e conseguimos”, disse.O gestor anunciou que um edital de incentivo à cultura e arte já está previsto no plano estratégico cultural do Estado para o próximo ano. “Vamos lançar um edital que contempla música, artesanato, artes cênicas, comunidades quilombolas e indígenas, com um pouco mais de implemento dos negócios para feiras de artesanato e turismo”, finalizou.OportunidadeO resgate do velho, o despertar do novo. Com o objetivo de dar espaço a novos talentos e trazer de volta pioneiros do cenário artístico e cultural do Tocantins, algumas iniciativas como a Sexta Cultural, Canta Tocantins e o Tocantins mostra a sua cara, vieram para dar nova vida a diversas localidades da Capital e ao gosto musical dos tocantinenses.O Memorial Coluna Prestes passou a receber a Sexta Cultural, evento que reúne jovens da periferia que trazem consigo o hip hop e o funk e diversos artesãos para exporem seus talentos à comunidade. Já o Espaço Cultural está sendo movimentado com o projeto Tocantins mostra a sua cara, que traz pessoas do interior do Estado para exporem seus trabalhos artísticos na Capital tanto a formadores de opinião quanto aos que porventura não o conheciam.“Além de resgatar a autoestima inserindo os artistas no mercado nós estamos estabilizando e transferindo a cultura que estava um pouco abandonada para o jovem, que é realmente quem tem que assimilar e repassá-la para o futuro”, expôs Tom Lyra.Os próximos 31 anosSão inúmeros os desafios e perspectivas para os próximos 31 anos de um Estado que busca desenvolver cultura por meio de tantas expressões.Para o Estado, os primeiros passos são a viabilização de um Teatro ou Centro Cultural no Tocantins, além da busca por talentos cênicos no interior. “Não é possível dar oportunidade para as pessoas se não há um espaço para elas mostrarem o seu talento. Além disso, temos muitos talentos nas cidadezinhas que fazem teatro e podem ser aproveitados. Temos que achar esses talentos”, afirmou Tom Lyra.Para outros, o Tocantins é um ambiente cada vez mais propício para lançar artistas de renome a nível nacional, que por ora são conhecidos apenas localmente. “É um desafio de começar do zero, mas acho que ele gera oportunidade para quem tem a intenção de passar uma vida dedicada à arte e fazer seu nome aqui, virar uma referência e criar um histórico que a gente ainda não tem”, destacou Sul.Um trabalho de formiguinha e resistência, segundo Meire, executado aos poucos, dia a dia. “Continuamos com todas as dificuldades, sobrevivendo e esperando que haja uma reflexão muito grandem não só do governo, mas também do próprio cidadão. Momentos de reflexão, discussão e diálogo são imprescindíveis para a reconstrução das atividades culturais e artísticas do Estado”.-Imagem (1.1902146)-Imagem (1.1902148)-Imagem (1.1902152)