Os coreanos voltaram a brilhar em Hollywood. Quer dizer, coreanos e americanos-coreanos. No lugar de um asiático da gema como "Parasita", vencedor dos principais prêmios da temporada do ano passado, agora é a saga de uma família coreana nos Estados Unidos que está roubando os holofotes das cerimônias.

"Minari", do diretor americano filho de imigrantes Lee Isaac Chung, surpreendeu no último dia 28 ao derrotar o favorito "Another Round", do prestigiado dinamarquês Thomas Vinterberg, na categoria filme estrangeiro do Globo de Ouro.

Não foi sem polêmica, como já é tradição da festa. Afinal, "Minari" é uma produção americana, rodada no estado americano de Arkansas, sobre a essência do sonho americano. Mas o fato de ser falado em coreano o desclassificou do prêmio principal. Houve indignação na comunidade asiática, que já vem sofrendo ataques racistas no país nos últimos meses por causa da pandemia.

"Não vi nenhum filme mais americano do que 'Minari' neste ano", disse a diretora Lulu Wang, que passou pelo mesmo mal-estar no ano anterior com seu "A Despedida", rodado boa parte na China, sobre uma jovem americana filha de imigrantes. "Nós realmente precisamos mudar essas regras antiquadas que caracterizam os americanos como apenas falantes de inglês."

O ator Daniel Dae Kim, de "Lost" e "Hawaii Five-0", também reclamou. "É o equivalente cinematográfico de receber ordens para voltar ao seu país quando seu país é na verdade os Estados Unidos", escreveu.

"Minari", nome de uma erva coreana, segue a trajetória do casal Jacob, papel de Steven Yeun, de "Walking Dead", e Monica, vivida por Han Yeri, ao tentar recomeçar a vida montando uma fazenda de vegetais coreanos nos campos de Arkansas, nos anos 1980.

Eles têm dois filhos pequenos que nasceram nos Estados Unidos e falam em inglês entre si. A avó de Monica vem da Coreia do Sul para ajudar a cuidar das crianças, enquanto os pais trabalham numa outra fazenda separando pintinhos pelo sexo.

Chung explicou que "Minari" é sobre uma família "tentando aprender a falar uma língua própria". "É mais profundo do que qualquer língua americana e estrangeira. É uma língua do coração", disse o diretor ao ganhar o Globo de Ouro, abraçado à filha de sete anos.

"Espero que todos nós possamos aprender a falar essa língua do amor uns com os outros, especialmente neste ano."

Este é o terceiro longa de Chung. Sua estreia foi "Munyurangabo", de 2007, exibido em Cannes e Berlim, sobre a amizade de dois jovens de etnias diferentes na Ruanda dividida entre tutsis e hutus. "Minari" estreou em Sundance no ano passado e saiu vencedor nas categorias júri e público.

No último domingo, no Critics Choice Awards, um dos termômetros mais precisos da corrida ao Oscar, conquistou o prêmio de filme em língua estrangeira e ator jovem, com Alan S. Kim. "Minari" também já está na pré-lista do Oscar para melhor trilha e música.

A temporada de prêmios foi modificada por causa da pandemia e está apenas começando. Os indicados da Academia serão conhecidos no dia 15 de março, e a entrega será no dia 25 de abril.

Para interpretar Soonja, a avó que chega a Arkansas com as sementes de minari (e muitas outras comidinhas coreanas), Chung conseguiu escalar a atriz Yuh-jung Youn, tão popular na Coreia do Sul que nos Estados Unidos ganhou o apelido de "Meryl Streep coreana".

Aos 73 anos, ela acumula tantos prêmios por "Minari" que há quem veja como certa uma indicação ao Oscar de coadjuvante, o que seria algo inédito para um ator coreano. Youn concorre ao sindicato dos atores e ao Spirit Awards, além de já ter vencido em diversas associações de críticos de cidades americanas.

"Meu pai estava muito preocupado comigo, com meu futuro e meu sucesso com diretor. Mas quando falei que Yuh-jung Youn estaria no meu próximo filme, ele relaxou. Para meu pai, estou feito", disse Chung num encontro virtual da American Cinematheque.

"Ela sempre esteve em nossa sala quando assistíamos à TV coreana. Meu pai costuma dizer que ela é uma das poucas pessoas na Coreia que pode falar palavrão."

Em entrevista ao Los Angeles Times, Youn comentou que a imprensa coreana está vibrando com a perspectiva de outro Oscar histórico. A culpa é de Bong Joon Ho, diretor de "Parasita", que levou quatro estatuetas em no ano passado -melhor filme, direção, filme internacional e roteiro. "Se Bong Joon Ho não tivesse vencido, o povo coreano não estaria tão interessado", ela disse.