Um novo público todos os dias e um cenário que, constantemente, está em transformação. Sem se importar com grandes estruturas ou de estar cercados entre quatro paredes, é a forma como muitas pessoas trabalham em várias cidades brasileiras, ao escolheram as ruas para mostrar seus talentos nos mais diversos segmentos artísticos. Essas pessoas veem nesses espaços a possibilidade de disseminarem cultura para os mais diversos públicos, além de ser uma oportunidade para tirarem dali o sustento de suas famílias.

Um bom exemplo em Palmas é do casal de músicos Joaquim Conceição Carvalho, de 77 anos, e Francisca Pereira Carvalho, de 53 anos, que marcam presença constantemente nas feiras cobertas das quadras 304 Sul, 1106 Sul, Jardim Aureny I e na Feira do Bosque. Com anos de experiência na música e com muitas histórias para contar, Joaquim Conceição Carvalho, mais conhecido como Ceguim da Feira, é um exemplo de brasileiro ‘arretado’, que apesar de todas as dificuldades que enfrentou, leva sempre no rosto um sorriso que contagia a todos.

Apesar de ter nascido cego, ele não se abateu e não deixou que isso o impedisse de ‘domar’ a sanfona. Natural do município de Cajazeiras, na Paraíba, ele lembra que aprendeu a tocar sanfona ainda jovem, quando o então patrão lhe ensinou uma simpatia. “Comprei uma bacia de alumínio e na noite de quinta para sexta-feira a simpatia tinha que ser feita. Deixei os pés descansarem e ‘catei’ a música que mais gostava, botei os pés na bacia e comecei a tocar. Dito e feito, depois disso os dedos desembaraçaram para tocar e em 15 dias já me apresentei e um casamento.”

Com esforço, persistência e muito de talento, esse guerreiro aprendeu a tocar sanfona e, há anos, faz desse dom uma forma de ganhar a vida e garantir o pão de cada dia. Ceguim da Feira conta com o apoio de sua companheira, Francisca, que o acompanha na zabumba. “Aprendi a tocar cozinhando, com o toque das panelas”, lembra ela.

Em troca de algumas moedas, dadas por quem passa pelo local, eles seguem na luta diária e garantem que, apesar da dificuldade de locomoção que enfrentam para chegarem aos locais de apresentação, são felizes e não se imaginam fazendo outra coisa da vida.

 

Impressão

Com olhar curioso e de admiração, o músico Cleiton Silva, de 26 anos, que está de passagem pela Capital, conta que ficou impressionado com a habilidade do sanfoneiro, ao se deixar levar pela música. “Ele não só domina a sanfona, mas canta com uma alegria contagiante”, conta o músico. E não há uma só pessoa que passe por eles que não observe a desenvoltura do talentoso sanfoneiro. Uns, mais animados, até arriscam alguns passos de dança, enquanto os mais acanhados observam com olhar de admiração e pés inquietos, que insistem em seguir o ritmo da música.

E basta só um cantinho para esses dois estarem prontos e interpretarem grandes clássicos do forró e xote, como a consagrada Asa Branca, de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, a quem Ceguim da Feira é admirador incondicional. E é assim que esse casal vive seus dias com muito trabalho, alegria e prazer por aquilo que fazem.

 

Literatura

Outro bom exemplo é o do poeta de cordel Carmevaldo Gomes Leal, de 62 anos, mais conhecido como Poeta Carmevaldo, figura conhecida de quem frequenta semanalmente a Avenida JK, em Palmas, e a Feira Coberta da 307 Norte, aos domingos.

Cordelista de mão cheia, o poeta Carmevaldo sempre está pronto para encantar com suas belas poesias, os que dedicam alguns minutos do tempo para apreciar o seu trabalho e o resultado é sempre positivo. Munido de uma mesinha, cadeira e alguns exemplares de suas obras, Carmevaldo utiliza as palavras para expressar seus sentimentos e retratar as coisas da vida.

O poeta nasceu em Natividade, na época que ainda era Goiás, mas o gosto pela literatura veio de berço. Vindo de uma família de genuínos cordelistas, ele só descobriu o dom que tinha, há cinco anos. De lá para cá, já foram três livros, 150 títulos de cordel e 800 títulos de Filosofia produzidos. Casado e com quatro filhos, ele conta que, por enquanto, nenhum dos filhos escreve textos literários, mas espera que, em breve, eles sigam seus passos e garantam a continuidade da tradição familiar.

Sobre a escolha da rua para mostrar seu trabalho, ele conta que gosta da liberdade e com o contato direto com seu público. “É um estilo de trabalho que combina com o cordel. As pessoas gostam e se identificam com as histórias que eu conto. Não vejo nenhum ponto negativo em trabalhar da forma como eu trabalho.”

 

Malabares

A capa do caderno Arte & Vida do dia 30 de março trouxe histórias curiosas de malabaristas de semáforos da Capital. A matéria mostrou personagens, como a professora Laís de Paula, que abandonou a sala de aula para viver de arte na rua. “A rua é um espaço público e acredito que deve ser usado de uma forma transformadora”, disse a artista.Laís faz malabares com bambolês e as apresentações acontecem nas ruas, mais precisamente nos semáforos. Ela considera o que faz como um trabalho, mas não no sentido financeiro. “Não me preocupo com dinheiro”, diz ela, que é artesã e ainda costura as próprias roupas. “Tenho tudo que preciso para viver”.