Apesar de ser um termo desconhecido pela maioria das pessoas, a alienação parental é uma conduta antiga, mais comum do que se imagina. Sua definição pode ser explicada como a interferência promovida ou induzida pelos que têm a criança ou adolescente sob a sua autoridade, para afastar o genitor do convívio, ou seja, o alienador faz a cabeça dessa criança ou adolescente para que construa uma imagem negativa da outra pessoa.

Conforme o artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), toda criança tem o direito de crescer em um ambiente que garanta sua integridade física, psíquica e moral e sendo preservada sua autonomia, seus valores, ideias e crenças. E é dever de todos velar por esses direitos. A alienação parental fere esse direto, pois interfere principalmente no desenvolvimento psíquico da criança ou do adolescente.

A telefonista palmense Amanda Rocha, de 23 anos, passou por isso em sua infância quando o pai obteve sua guarda e de seu irmão na Justiça após a separação, momento em que são registrados boa parte dos casos. Isso ocorreu quando ela tinha oito anos, e mesmo não guardando mágoas sobre esse período, lembra com lágrimas nos olhos dos anos que passou longe da mãe. “Eles tinham um casamento muito conturbado e minha mãe sempre quis se separar, mas ele não aceitava. E nós víamos o sofrimento dela. Mas acho que para atingir minha mãe ele entrou na Justiça para conseguir nossa guarda, colocando até falso testemunho para isso. E quando conseguiu, nós nos mudamos para Brasília (DF), e depois para Anápolis (GO)”, comenta a Amanda, ressaltando que sua mãe não foi avisada sobre essa mudança, e por um ano elas não tiveram nenhum contato.

“Lembro que minha mãe não podia chegar a 100 metros da porta da casa onde morávamos. Achei isso errado porque éramos crianças. Ele não dava satisfação nenhuma, dizia que minha mãe não queria saber da gente e denegria a imagem dela para que nós não tivéssemos contato com ela. Era muito ruim porque eu sempre fui muito apegada a ela. Mas quando tinha alguma audiência, ele nos levava e eu grudava nela com medo de ficar longe”, lamenta a jovem.

Amanda e o irmão só voltaram a ter um contato mais próximo da mãe aos 13 anos, quando tiveram condições de escolher com qual dos pais queriam viver. Assim escolheram a conviência com a mãe, e retornaram para Palmas.

 

MPE na prevenção da alienação

Não são só os pais ou parentes que possuem o dever de assegurar integridade psíquica dos menores quanto à alienação parental. Instituições como o Ministério Público do Estado (MPE-TO) são incumbidas de orientar a população sobre os males dessa prática, que por vezes é inconsciente, mas que pode trazer sérios danos para a formação do indivíduo.

Promotor 

Conforme o promotor Diego Nardo (foto), titular da 6ª Promotoria de Justiça de Porto Nacional, antes da Lei 12.318/2010 regulamentar a alienação parental, as decisões não eram voltadas para esse problema e hoje os pontos onde a prática é identificada são trabalhados em prol da criança ou adolescente. “Para atuar na alienação parental, o promotor deixa de ser mais enérgico e passa a ser mais conciliador. E hoje o juiz reconhece quando ocorre a alienação. Então o promotor pode trabalhar com cautelares, que são medidas de proteção à criança, que podem ser desde o aumento no número de visitas ou advertência verbal. Tudo isso é discutido dentro dos processos”, pontua.

“Nas ações de divórcio, como os ânimos ficam exaltados, você acaba conhecendo um lado do parceiro ou parceira que não era conhecido, e fica com medo disso. E desse temor, você pega o filho para ser um aliado ou até para proteger dessa pessoa que você não conhecia. E de aliado, a criança passa a ser alienada, conforme o seu bloqueio fica cada vez mais forte”, complementa o promotor, destacando que toda a decisão ou conclusão acerca da alienação parental é baseada na investigação e apuração através de laudos, principalmente em casos de alegação de abuso sexual.

Nardo destaca que o MPE-TO oferece oficinas de parentalidade nos municípios do Estado, sobre a conscientização, prevenção e as consequências da alienação parental, bem como para incentivar a conciliação no caso de disputas judiciais entre pais que podem afetar os filhos.

"Toda criança precisa ter a influência dos dois pais, e a falta de um deles pode gerar consequências imediatas e posteriores", 

 

 

 

Diego Nardo, promotor de Justiça

 

 

Justiça pode e deve ser informada

Quando um pai, mãe ou parente que se sente prejudicado ao ser afastado da criança em um processo de divórcio, definição de guarda ou pensão alimentícia, e percebe que isso está afetando o menor, é preciso comunicar a Justiça. De acordo com a juíza substituta da 1ª Vara da Família e Sucessões de Palmas Odete Batista Dias Almeida, diversas situações são consideradas como alienação parental. “Desqualificar o genitor que não tem a guarda, dificultar o exercício da autoridade parental, dificultar visitas, omitir informações da criança na escola ou detalhes médicos, tudo isso tem amparo legal àquele genitor que se vê vedado dessas informações”, explica.

A mudança de domicílio sem justificativa plausível, como aconteceu com a telefonista Amanda Ferreira Rocha, de 23 anos, que contou sua história ao Jornal do Tocantins, também é considerada alienação parental, diz a juíza: “Já tivemos casos em que a pessoa pretendia mudar até de país exatamente para obstar aquela visitação do outro genitor, e essa mudança tem consequências e pode ser um indicador de alienação parental”.

Penalidades previstas

Quando isso ocorre, se o juiz verificar que pode ser uma “artimanha” para dificultar a visitação do outro genitor, o pai ou mãe que se mudou pode ficar obrigado a arcar com o ônus das despesas de levar e trazer a criança para visitação.

 

Geralmente, explica a juíza, quem leva essa demanda de possível alienação à Justiça é quem está sofrendo com a falta da criança, que maioria das vezes é o pai. E o Judiciário possui procedimentos para identificar a prática e as penalidades, que vão desde advertências até a inversão da guarda. “Também pode ser declarada a suspensão da autoridade parental, que por vezes é mais eficaz. Ampliar o regime de visitas também pode ocorrer, porque o pai ou mãe prejudicado precisa desmistificar essa alienação parental e, para isso, precisa conviver mais com o filho, tudo voltado para o bem-estar da criança”, finaliza.

“Essa conduta de alienação parental fere o direito fundamental da criança e do adolescente”. 

 

 

 

Odete Batista Dias Almeida, juíza 

 

“Os pais precisam amadurecer para evitar a alienação”, diz psicóloga

Além dos indícios apurados no processo, seja de disputa de guarda ou outros, a alienação é comprovada pela Justiça através de laudos psicossociais feitos com os pais, parentes, com as crianças e por profissionais de diversas áreas. 

Luciane Prado Psicóloga

De acordo com a psicóloga Luciane Prado (foto), a também chamada Síndrome da Alienação Parental é comum e o Judiciário está cada vez antenado às questões de família. “É uma situação de grande sofrimento porque a criança precisa sentir segurança no afeto tanto do pai quando da mãe”, explica.

A psicóloga comenta ainda que a alienação pode gerar na criança a insegurança afetiva, atrapalha no desenvolvimento escolar e tem toda a chance de se tornar um adulto medroso, com dificuldade de tomar decisões e se relacionar com as pessoas. “Também é muito forte o sentimento de culpa. Ela cresce achando que tudo que acontece é culpa dela, que não é suficiente. Isso é muito sério, e não são só os pais que fazem a alienação, é preciso prestar atenção no núcleo familiar”, pontua.

Além disso, a concepção de pai ou mãe deve ser separada da de marido ou mulher. “Nem sempre um mau marido ou esposa vão ser pais ruins. Então a criança precisa ter essa liberdade de convivência. E ainda se os pais não forem um exemplo, é cruel contar para a criança os defeitos desse pai, mãe ou parente, privando o convívio por uma questão mal resolvida”, diz Luciane, mas reforçando que existem casos em que é necessário o afastamento do menor após constatado que a parte estava prejudicando seu desenvolvimento, mas explicando a real situação.

Para fugir desse ímpeto de envolver a criança em uma mágoa pessoal, a profissional dá a dica: “Os pais precisam amadurecer. Ter uma disposição para um autoconhecimento e para a autotransformação, porque enquanto nós adultos olharmos para nossos problemas culpando os outros, estamos imaturos e, assim, não poderemos nos relacionar, ainda mais quando tem a criação de uma criança em jogo”, finaliza

MPE-TO promove seminário para debater a alienação parental

Alienação MPE

O Ministério Público Estadual (MPE-TO) e a seccional tocantinense do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM) promovem hoje o seminário “Desafios da Prevenção e Combate à Alienação Parental”, que ocorrerá nos períodos da manhã e tarde em Palmas, com possibilidade de participação presencial e a distância. De acordo com o MPE-TO, o seminário será realizado na sede do órgão, em Palmas, e terá carga horária de sete horas.

A programação contará com a realização de três palestras ministradas por duas especialistas da área de Direito: Líbera Copetti de Moura Pereira, graduada em Direito, especialista em Direito de Família em Sucessões, especialista em Direito Civil e Processual Civil, e mestranda em Responsabilidade Civil pela Universidade de Girona/Espanha; Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers Ramos, graduada em Direito, mestra em Direito, com especialização no Atendimento à Crianças Vítimas de Violência. Doutoranda em Direito Penal (UERJ) e também a palestra de Sandra Maria Baccara Araújo, graduada em Psicologia, mestra em Psicologia e doutora em Psicologia. Especialista em Psicologia Clínica (CFP), em Psicoterapia Infantil e do Adolescente e em Psicoterapia Conjugal e Familiar.

Os interessados em participar presencialmente devem solicitar inscrição pelo endereço eletrônico cesaf.mpto.mp.br/eventos. Já pela modalidade à distância, o interessado deve se inscrever em eadcesaf.mpto.mp.br. São 200 vagas presenciais e 300 à Distância (EaD).

Alienação Parental