O Famalicão vem dando o que falar no Campeonato Português: após sete rodadas, este pequeno clube recém-promovido à primeira divisão aparece na liderança da competição, à frente dos gigantes Benfica e Porto, e vai se colocando entre os favoritos da temporada. O segredo? O trabalho do empresário Jorge Mendes, com boa abertura no país e bons jogadores na carteira, e o talão de cheques de um bilionário israelense, desses empresário que gostam de futebol e se metem a apostar fortunas no esporte.

"Nem nos meus sonhos mais loucos eu poderia imaginar que lideraríamos o Campeonato Português!", comemora Ramiro Carvalho, sócio do Famalicão há cerca de 40 anos. O clube é fundado em 1931, no distrito de Braga.

Ramiro tem 64 anos. O empresário, vestido com a camisa azul do clube, percorreu os 350 km que separam Famalicão de Lisboa para assistir a equipe derrotar por 2 a 1 o tradicional Sporting. Faz isso com muita frequência. A vitória ajudou os 'Famalicenses' a permanecer na liderança da competição nacional na última rodada. Com 19 pontos, somam uma unidade a mais do que Benfica e Porto após sete partidas na temporada. É claro que é cedo para comemorar, mas esse começo de torneio está dando muita alegria aos torcedores do Famalicão.

A reviravolta no clube começou em junho do ano passado, quando o magnata israelense do petróleo Idan Ofer aceitou o desafio lançado pelo amigo Jorge Mendes de ter um time de futebol. Este bilionário, dono de um terço do Atlético de Madrid, da Espanha, decidiu investir na equipe desta cidade industrial de 130.000 habitantes, situada a cerca de 30 km do Porto (norte), quando o clube agonizava no fundo da tabela da segunda divisão portuguesa. Injetou dinheiro enquanto o amigo injetava jogadores. A combinação deu certo.

Um ano depois, o Famalicão está na elite do futebol português após 25 anos de ausência e tem um orçamento anual de 7,5 milhões de euros (R$ 34 milhões), um décimo do orçamento do Sporting, por exemplo, mas duas vezes mais do que o de clubes recém-promovidos à primeira divisão nos últimos anos.

No início de setembro, Idan Ofer aumentou a participação de sua holding Quantum Pacific no capital do clube de 51% para 85%. O clube conta, no entanto, com a rede de contatos do poderoso agente de atletas Jorge Mendes e de sua empresa, a Gestifute, que gere as carreiras de grandes nomes do futebol internacional, como o cinco vezes melhor do mundo Cristiano Ronaldo, o técnico José Mourinho, também português, ou a jovem promessa portuguesa João Félix, que na última janela se transferiu do Benfica para o Atlético de Madrid por 126 milhões de euros (R$ 573 milhões).

"O Famalicão tem uma relação privilegiada com Jorge Mendes. A Gestifute foi sócia do clube e da Quantum Pacific na constituição de nossa sociedade anônima. Foi quem celebrou o casamento entre as duas partes", confirmou o diretor geral do Famalicão, Miguel Ribeiro, em recente entrevista ao jornal português Expresso.

"Temos a ambição de colocar o Famalicão no mais alto nível do futebol português, e quando digo isso não estou só falando de permanência na primeira divisão", garantiu o ex-homem forte do Rio Ave, outro clube do norte de Portugal que se beneficiou da influência de Jorge Mendes no passado.

Quando os sócios do Rio Ave recusaram ceder o controle do clube aos chineses da Fosun, o empresário, de 53 anos, buscou um novo projeto no Famalicão. Para colocar o Famalicão na elite, Mendes reforçou a equipe com cerca de 20 jogadores ligados à Gestifute ou a clubes europeus com os quais tem negócios. Deu certo. Foi uma questão de tempo para que o time colhesse frutos. O futebol não é muito diferente dos demais rivais de Portugal, mas há um entusiasmo natural dos que sobem para a divisão de elite e, mais ainda, que lideram a competição, deixando Porto e Benfica para trás.

Diversas promessas do Benfica, do Atlético de Madrid, do Valencia, do Wolverhampton ou do West Ham foram assim emprestados, como o zagueiro argentino Nehuen Pérez, que concorre ao prêmio Golden Boy do país. Somente quatro jogadores do elenco atual estavam na equipe no ano passado e, segundo estimativas do site especializado Transfermarkt, o valor de mercado do clube saltou de 9 milhões de euros (R$ 40 milhões) no ano passado para 21 milhões de euros (R$ 95 milhões) nesta temporada.

ESTÁDIO DE 5 MIL LUGARES
"Temos consciência da importância de Jorge Mendes no clube, sem ele o Famalicão não poderia trazer todos esses jogadores", reconhece Francisco Fontão, torcedor de 37 anos. De seu status de recém-promovido, o clube só conserva um estádio pequeno para apenas 5.000 espectadores, que será ampliado em 2.000 lugares até 2021, após investimento de 8 milhões de euros (R$ 36 milhões).

Enquanto alguns torcedores já sonham com uma possível classificação para competições europeias, acessíveis a partir do quinto lugar no Campeonato Português, o técnico João Pedro Sousa prefere manter os pés no chão. "Não pensamos na Europa. Nosso objetivo é a permanência (na primeira divisão) e não pensaremos em nada mais enquanto isso não for alcançado", declarou o treinador após a vitória de peso sobre o Sporting.

APOSTA NOS BRASILEIROS
A equipe portuguesa tem como principal aposta jovens jogadores brasileiros. São 11 no total, incluindo o garoto João Neto, meia de 16 anos. A galeria de fotos (acima) traz um breve perfil de quem são esses atletas. Curiosamente, há no elenco mais brasileiros do que portugueses. Destaque também para o jovem Gustavo Assunção, meia, de 19 anos. Ele atuou nas categorias de base do Atlético de Madrid antes de chegar para o clube português neste ano. Um dos destaques do time é o atacante Anderson Silva. Ele nasceu em São Paulo e jogou futsal até os 17 anos. No campo, teve passagens pelo Guaratinguetá e Guarani, mas não agradou. Chegou ao Famalicão há três anos.