A Susep (Superintendência de Seguros Privados) aplicou nesta quarta-feira (18) a correção monetária dos valores cobrados da Seguradora Líder, empresa responsável por gerir o DPVAT, seguro obrigatório para proprietários de veículos, e constatou que a quantia ultrapassa a marca dos R$ 2,2 bilhões.A investigação, revelada pela Folha de S.Paulo, detectou ao menos R$ 1,2 bilhão em valores não corrigidos em supostos gastos irregulares da Líder. A correção fez o valor quase dobrar, ficando em exatos R$ 2.257.758.435,26.Responsável pela fiscalização do setor de seguros, a Susep quer o ressarcimento dos recursos aos cofres públicos. As supostas irregularidades ocorreram entre 2008 e 2020 e o valor final deverá ser corrigido.Entre os valores cobrados, está o montante de R$ 62 milhões pela suposta alocação indevida como despesa administrativa do DPVAT de participação nos lucros ou resultados, quando a Susep entende que o valor não deveria ser aplicado, por ser entidade sem fins lucrativos.Outra cobrança é de R$ 180,7 milhões em repasses a entidades, como um convênio de cooperação técnica-operacional para divulgar o seguro, mas a Susep diz não ter encontrado comprovação dos serviços prestados, pedindo ressarcimento de R$ 73,4 milhões.Em outro convênio, segundo as investigações, a Líder teria acertado repasse de R$ 2,6 milhões mensais a uma fundação para realizar estudos e cursos sobre o DPVAT para treinamento de corretores e reguladores, somando R$ 93,6 milhões considerados indevidos pela superintendência.A Susep ainda afirma que identificou pagamentos irregulares para pessoas relacionadas à administradora, o que favoreceria sobrepreço e repasses indevidos. Empresas de familiares teriam recebido R$ 71,7 milhões, enquanto um parente de diretor supostamente recebeu R$ 67,6 mil pela compra de um veículo.Em documento assinado no último dia 11, o procurador federal Jezhiel Pena Lima dá 30 dias para que os recursos de R$ 1,2 bilhão (R$ 2,2 bilhões quando corrigidos) sejam devolvidos.A gestão do DPVAT é alvo também de uma ação do Ministério Público Federal, que pede o bloqueio de R$ 4,4 bilhões acumulados nas reservas técnicas do seguro. A Procuradoria alega que os recursos são fruto de fraudes para inflar o valor do seguro.O seguro DPVAT foi tema de uma série de reportagens da Folha que mostraram denúncias de mau uso do dinheiro arrecadado -com a compra, por exemplo, de veículos e garrafas de vinho- e de conflitos de interesse e favorecimento de sindicatos de corretores.As primeiras denúncias foram feitas em relatório da consultoria KPMG, contratada pela própria Líder para averiguar suas contas após a deflagração da Operação Tempo de Despertar, que investigou um suposto esquema para a concessão de sinistros fraudulentos.A investigação da Susep considerou os achados do relatório da KPMG e analisou outras transações identificadas pela auditoria interna da Líder e por fiscalizações do próprio órgão regulador.De acordo com essa investigação, as supostas irregularidades permaneceriam na gestão atual, nomeada pelos controladores da companhia após a operação da Polícia Federal.Ao todo, a fiscalização identificou 2.119 transações suspeitas. Entre essas suspeitas estão, por exemplo, doações sob influência política, contratação de consultoria com interesse próprio da Líder, pagamento de participações nos lucros, convênios e patrocínios sem evidência de prestação de serviços.A Líder afirma que recebeu ofício encaminhado pela Susep em 16 de novembro e informa que está comprometida com todos os esclarecimentos que se façam necessários sobre a gestão dos recursos do seguro DPVAT.A seguradora também apontou "que não tolera, em hipótese alguma, quaisquer práticas irregulares ou ilícitas".Ainda complementou que sua "atual diretoria implementou diversas boas práticas de governança e integridade corporativa para estar sempre aderente às premissas legais e regulatórias do setor, inclusive na relação com seus fornecedores e prestadores de serviços, que devem ser contratados com base em critérios técnicos, imparciais e transparentes".De acordo com a Líder, a maioria das transações financeiras citadas no ofício da Susep refere-se ao entendimento de que os recursos do DPVAT são públicos, contrariando decisão do Tribunal de Contas da União e do poder Judiciário e objeto de contestação da Seguradora Líder em ações judiciais.Por fim, a seguradora apontou que sua defesa será protocolada no prazo de 30 dias, conforme previsto no ofício enviado pela Susep.