As mudanças feitas no texto da reforma da Previdência pelo relator, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), desagradaram à área econômica do governo, segundo apurou o Estadão/Broadcast. A avaliação é de que a retirada de R$ 31 bilhões da potência fiscal da proposta aprovada pela Câmara já na largada será facilmente aprovada, ao contrário das compensações prometidas pelo senador tucano. Congressistas também veem com ceticismo a possibilidade de as medidas de receita avançarem na Casa.

Jereissati sinalizou que a proposta “paralela” que está sendo construída para mexer em alguns pontos da reforma sem atrasar seu cronograma de tramitação conterá três medidas para elevar as receitas previdenciárias, com impacto de R$ 155 bilhões em dez anos. Mas o mesmo texto traz flexibilizações que desidratam a proposta em outros R$ 67 bilhões.

A Câmara dos Deputados já tentou duas das medidas propostas – reoneração previdenciária de entidades filantrópicas e de exportações do agronegócio –, sem sucesso. O temor no governo é que as medidas de arrecadação sejam abandonadas e fiquem apenas as que resultam em mais desidratação. A proposta paralela é vista como “tecnicamente perfeita” ao prever as compensações, mas de difícil aprovação.

O relator na Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), também cogitou rever isenções das filantrópicas, mas acabou deixando de lado diante da pressão do setor. Horas depois da divulgação do parecer de Jereissati, o Fórum Nacional das Instituições Filantrópicas (Fonif) divulgou nota em reação à mudança. “As entidades do segmento têm garantidas pela Constituição Federal imunidades tributárias em função do importante trabalho realizado”, diz o comunicado.

O líder do PSD no Senado, Otto Alencar (BA), afirmou que o destino da proposta paralela é a gaveta. “É muito difícil, é impossível de passar”, avisou. Ele lembrou ainda que a Câmara é contra a possibilidade de inclusão de Estados e municípios na proposta.

O senador Major Olímpio (PSL-SP), líder do partido do presidente Jair Bolsonarona Casa, também demonstrou resistências. “Tem entidades que é isso danado. Ontem eu estive em São José dos Campos, no Gaac. Se você for onerar alguma coisa a mais para eles, você começa a escolher as crianças que têm de morrer. Isso é delicado. Vamos sentar e analisar”, disse. O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), também prevê obstáculos, mas vê espaço para rever a isenção do agronegócio. “Se tem um setor que, na minha opinião, não pode se ausentar no momento em que todos estamos sacrificando alguma coisa, é o agronegócio”, afirmou.

A própria presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), fez questão de ressaltar mais cedo que as propostas de reversão de desonerações previdenciárias partiram unilateralmente de Jereissati. “Não é nem minha, nem do presidente da Casa. É do relator. Eu vou olhar em detalhes, não vou me antecipar sobre algo que eu ainda nem sei o impacto. Tudo na vida é custo benefício”, disse após a entrega do parecer.

Jereissati anunciou que seu relatório resultava em impacto de R$ 990 bilhões para os cofres da União em uma década – muito próximo da meta do governo de obter economia de R$ 1 trilhão com a reforma. Mas o texto atual sozinho deve resultar, na verdade, num efeito de R$ 902 bilhões no período.

A versão que chegou da Câmara previa economia de R$ 933,5 bilhões, mas o relator fez duas mudanças que não dependem de nova chancela dos deputados – ou seja, ficariam valendo da maneira que for aprovada pelo Senado. Ele retirou o trecho que colocava na Constituição o critério de renda para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, como antecipou o Estadão/Broadcast. A medida, cujo objetivo era reduzir o alto índice de ações na Justiça, resultaria em economia de R$ 25 bilhões em dez anos. Além disso, o senador tucano subtraiu as regras mais apertadas de transição para a aposentadoria de trabalhadores expostos a agentes nocivos, como mineiros. O custo é de R$ 6 bilhões.

Os outros R$ 88 bilhões contabilizados por Jereissati vêm das medidas para ampliar as receitas previdenciárias e de mais flexibilizações na reforma. No entanto, elas dependem da aprovação de uma proposta paralela que está sendo construída e precisaria ter o aval também da Câmara dos Deputados.

A promessa é retomar a cobrança previdenciária de entidades filantrópicas (à exceção de Santas Casas e entidades de assistência social), muitas das quais cobram mensalidade ou pelo atendimento prestado, e sobre as exportações do agronegócio. Empresas do Simples Nacional também teriam que pagar pela cobertura de benefícios decorrentes de acidente de trabalho.

Mas a proposta paralela também inclui regras mais brandas para a pensão por morte (com garantia de um salário mínimo a quem tem renda formal inferior ao piso, além de um porcentual adicional para pensionista que tenha filho menor de 18 anos), aumento no valor das aposentadorias por incapacidade em caso de acidente e prorrogação no período que servidores federais podem optar pelo regime de previdência complementar, com vantagens e incentivos. O texto traz ainda a possibilidade de Estados e municípios aderirem à reforma federal por meio da aprovação de lei ordinária, o que renderia economia de R$ 350 bilhões.