Nem em suas previsões mais otimistas, as empresas que trabalham com vendas digitais conseguiram acertar o desfecho de 2020. O faturamento do comércio online no Brasil mais que dobrou. O crescimento foi de 122% no acumulado do ano até novembro, na comparação com o mesmo período de 2019, mostra indicador de ecommerce da Câmara Brasileira da Economia Digital e da empresa Neotrust.Foram movimentados R$ 115,3 bilhões no período, impulsionados pelas gigantes de ecommerce, que tiveram um ano marcado por investimento em infraestrutura. Segundo a Neotrust, elas responderam por 86% do mercado no terceiro trimestre deste ano.O comércio digital representa 8,6% do varejo, de acordo com o último dado, de outubro.O setor já estava aquecido antes de a Covid impor restrições sociais e ampliar o comércio digital. Com o novo cenário, que incentiva os negócios online, companhias como Mercado Livre, B2W, Magazine Luiza, Amazon e Via Varejo intensificaram processos de automação e expandiram área de armazenagem, inaugurando ou investindo em centros distribuição e logística durante a pandemia.A expectativa de empresas e especialistas do setor é que o desempenho do comércio digital se mantenha acima de níveis pré-pandemia no médio e longo prazo."O desempenho das grandes está relacionado, também, ao das pequenas, já que muitas empresas menores utilizaram a estrutura digital das grandes varejistas", diz Kelly Carvalho, economista da FecomercioSP. Empresas tradicionais do varejo, como Magazine Luiza, abriram suas plataformas online a pequenos comerciantes."A tendência é que o crescimento fique acima do nível pré-crise, pois a pandemia fez o setor avançar com muito mais força do que antes, e o ingresso de novos consumidores deve manter trajetória de alta", diz a economista.A performance de algumas empresas sinaliza bem essa tendência. Na Via Varejo, dona de Casas Bahia e Pontofrio, o marketplace e o canal online venderam R$ 4,1 bilhões entre julho e setembro, quando as medidas de isolamento já eram mais brandas. Trata-se de um crescimento de 219% em relação ao mesmo trimestre de 2019. A plataforma Vendedor Online ou o Me Chama no Zap representou 16% das vendas online no terceiro trimestre.Na Magazine Luiza, que investiu em uma série de startups durante a pandemia e adaptou a função de suas lojas físicas, o crescimento ano a ano das vendas digitais da companhia foi de 148%, fechando o trimestre de setembro a R$ 8,2 bilhões. O setor responde por dois terços das vendas da empresa, de acordo como o último balanço.Segundo a Neotrust, que monitora dados de grandes varejistas (não inclui Mercado Livre e OLX), o terceiro trimestre de 2020 teve 5,8 milhões de novos consumidores, que fizeram sua primeira compra pela internet. No mesmo período de 2019, foram 4,4 milhões.O consumo de eletrônicos, produtos mais caros e com alta demanda devido ao trabalho remoto, foi um dos principais responsáveis pelos ganhos no ano. No entanto, explica Fernando Yunes, vice-presidente sênior do Mercado Livre, o setor foi beneficiado por uma mudança generalizada nos hábitos de consumo.Destacam-se a entrada de novas lojas nos shoppings virtuais, a diversificação dos produtos nos carrinhos de compras, que cresceu no período, o ingresso de novos consumidores no comércio online, bem como o fato de clientes antigos adotarem novos hábitos, intensificando as compras digitais."São 8,9 milhões de pessoas que passaram a consumir, e os que já compravam, passaram a comprar mais vezes, aumentou muito a frequência de compra", diz Yunes. O investimento da empresa foi de cerca de R$ 4 bilhões em 2020.Na pandemia, o Mercado Livre lançou cinco novos centros logísticos, quatro no Sudeste e um no Sul, para início de operação entre o fim de 2020 e o início de 2021, e contratou uma frota com quatro aviões para entrega.Os armazéns foram implementados para diminuir o tempo de frete, um dos critérios que define a posição de um negócio na competição entre as grandes. A empresa tem a meta de dois dias úteis a entregas a todo país.A Amazon, que em 2019 lançou seu primeiro grande centro de distribuição no Brasil, em Cajamar (SP), tem hoje oito armazéns do tipo em cinco estados, quatro inaugurados na pandemia.A companhia não especifica quantas lojas entraram em seu marketplace, mas diz que as categorias de itens oferecidos passaram de 16 para 30, e o número produtos disponíveis subiu de 20 milhões para 30 milhões de um ano a outro.Assim como em outras empresas de ecommerce, o aumento na busca de itens de supermercado e farmácia fizeram diferença na cesta."Observamos crescimento geral da demanda em diversas categorias de produtos, como itens de primeira necessidade que têm uma demanda mais alta durante a pandemia. São alimentos, produtos de higiene e limpeza da casa, por exemplo", diz Juliana Sztrajtman, líder de Marketing e Prime da Amazon no Brasil.Já a B2W, que reúne Americanas, Shoptime e Submarino, passou a contar com quase 80 mil vendedores em sua base no terceiro trimestre, contra 38,7 mil no mesmo período de 2019. Dos 20,8 milhões de clientes ativos, quase 6 milhões entram no sistema nos últimos 12 meses.Em 2020, a companhia inaugurou cinco centros de distribuição, em Belém, Salvador e Fortaleza, Brasília e Vitória, antecipando o número de armazéns que estava previsto para 2022."Investiremos R$ 5 bilhões nos próximos dois anos em um pacote de estratégias implantado nos últimos anos, impulsionado agora pela pandemia ao longo de 2020", diz Jean Lessa, diretor de Tecnologia e Marketplace da B2W Digital.O maior crescimento no faturamento online, de acordo com índice da Câmara Brasileira da Economia Digital, foi na região Nordeste, com 160%, seguida de Norte (127,87%), Sul (122,36%), Centro-Oeste (120,37%) e Sudeste (113,25%).Em São Paulo, a FecomercioSP estima que o setor tenha crescimento de 32% no faturamento real em 2020 em relação a 2019, aumento de cerca de R$ 7 bilhões a mais nas receitas.