O acordo entre Mercosul e União Europeia celebrado no fim de junho foi o resultado de negociações diplomáticas entre os dois blocos que pareciam mergulhadas em impasse. As discussões duraram 20 anos. Mas as divergências que se acumulavam eram bem mais antigas. Uma delas diz respeito a algo que surgiu 211 anos atrás: a TUF (taxa de utilização de faróis), criada por Dom João 6º em 1808.

Assim que a família real portuguesa mudou-se com toda a corte de Lisboa para o Rio de Janeiro, fugindo das tropas napoleônicas, os portos brasileiros foram abertos às “nações amigas”.  A corte precisava de dinheiro para pagar as contas da casa nova, então aproveitou-se a oportunidade para criar a TUF. Instituir um tributo no Brasil já era algo fácil. E, uma vez existindo, a tendência, como mostraram 2 séculos de história, é nunca mais acabar.

A taxa funciona como uma espécie de pedágio marítimo. Cada vez que o navio estrangeiro para no porto, paga. Se atraca em Santos depois segue a Paranaguá, o armador, dono do navio, tem de desembolsar o valor duas vezes. É algo que varia entre US$ 1.500 e US$ 3 mil, conforme o tamanho da embarcação. Para companhias que usam muito os portos brasileiros, a conta chega aos milhões de dólares anuais. Por isso a preocupação dos negociadores europeus de eliminar a cobrança.

A arrecadação anual da Receita Federal com a TUF é de cerca de R$ 120 milhões. Disso, 10% vai para a Marinha para dar conta do que a taxa reamente se propõe: a manutenção dos faróis ao longo da costa brasileira, que ainda hoje ajudam os navios a se afastar dos rochedos, sobretudo em noites de tempestade. Mesmo com os radares, a precaução extra continua sendo útil.

Os armadores europeus pagam 25% de toda a arrecadação com a TUF. Uma boa parte do trabalho dos negociadores brasileiros foi convencer a Marinha a abrir mão da receita a que têm direito. O argumento é de que isso será compensado por rearranjos no Orçamento. E também que é importante para os militares e para todo o país a assinatura de 1 acordo que irá modernizar a economia brasileira, permitindo importar mais equipamentos, por exemplo.

O acordo ainda precisa ser ratificado pelo Parlamento Europeu e pelos quatro países do Mercosul. Se for aprovado, os armadores europeus terão outra vantagem: poder fazer o comércio entre países do bloco sul-americano, algo hoje proibido.

Argentina e Uruguai não têm a a TUF. Mas, assim como o Paraguai, oneram produtos de outros países com a chamada “taxa estatística”, que varia entre 0,5% e 2,5% da mercadoria que chega ao porto. Os europeus também ficarão livres disso. Mas os brasileiros, não.

A taxa estatística é cobrada mesmo no comércio entre países do bloco, que está longe de ser um mercado comum, com livre circulação de produtos, a ideia inicial. É algo a ser consertado. Em entrevista ao Poder360, o secretário especial de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, disse que o acordo com a União Europeia será a oportunidade para “dar um reset” no Mercosul.