O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, disse nesta quarta-feira, 29, que a auditoria externa contratada para investigar contratos do banco com as empresas do grupo J&F mirou oito operações que, em valores atualizados, somaram R$ 21,2 bilhões. “O valor é quase equivalente a todo valor desembolsado pelo BNDES a grandes empresas em 2019”, afirmou Montezano.Essa é a primeira vez que o presidente do BNDES se pronuncia desde a revelação em 20 de janeiro, pelo Estado, de que o banco pagou R$ 48 milhões em uma investigação externa para apurar eventuais irregularidades em operações com as empresas JBS, grupo Bertin e Eldorado Brasil Celulose, realizadas entre 2005 e 2018.O valor foi pago a um escritório estrangeiro, o Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP, que subcontratou outro brasileiro, o Levy & Salomão.Segundo Montezano, o objetivo da investigação era apurar evidências de violação de leis anticorrupção no Brasil ou nos Estados Unidos por integrantes do banco, como atos de corrupção ou suborno.O presidente do BNDES informou que a contratação da apuração externa foi recomendada em setembro de 2017 pelo auditor independente do banco (KPMG), que aconselhou o BNDES a “se proteger” contratando a investigação. A própria KPMG acompanhou as apurações como uma espécie de “revisor”, para verificar o passo a passo do Cleary.Montezano iniciou a entrevista dizendo que a transparência é “atributo fundamental” para qualquer instituição financeira. “A lei nos obriga, mas transparência também protege executivos e funcionários da instituição”, disse. “Credibilidade é atributo mais importante para uma empresa, daí nossa conversa”, acrescentou o presidente.Ele explicou que, desde que o tema da auditoria surgiu, há nove dias, as equipes do banco se debruçaram sobre as informações em relação à investigação para prestar os devidos esclarecimentos. “Entendemos que todos os pontos questionados estarão endereçados hoje”, disse.Montezano afirmou ainda que “compartilha da frustração e ansiedade” dos veículos de notícias sobre prazos para as respostas. Desde que o Estado revelou o valor da auditoria, o banco não havia se pronunciado.Nesta terça-feira, 28, o presidente Jair Bolsonaro disse que "tem coisa esquisita" no reajuste que levou o BNDES a pagar R$ 48 milhões a uma auditoria para abrir a "caixa-preta" do banco em operações com o grupo J&F, sem encontrar nenhuma irregularidade. Ao comentar o último aditivo, feito pelo atual presidente do banco, Gustavo Montezano, Bolsonaro disse que "parece que alguém quis raspar o tacho”, sem citar quem. "Expõe logo o negócio e resolve", ordenou o presidente ao chegar no Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência, depois da volta dele da Índia. A abertura da "caixa-preta" foi uma das missões conferidas por Bolsonaro ao Montezano, que tomou posse em substituição a Joaquim Levy, primeiro nomeado pelo governo para comandar a instituição. Ele se juntou a outros executivos que passaram pelo banco após o fim da gestão Dilma Rousseff e tiveram dificuldades para comprovar irregularidades na concessão dos financiamentos.No governo Temer, Maria Silvia Bastos Marques evitou o assunto. Paulo Rabello de Castro e Dyogo Oliveira negaram sua existência. "Ou sou um completo idiota ou não existe 'caixa-preta' no BNDES", chegou a dizer Rabello.Levy falou em "ter clareza sobre operações do passado", mas não chegou a avançar na busca por operações fraudulentas. A dificuldade foi apontada como um dos motivos para a insatisfação de Bolsonaro com sua gestão - o executivo pediu demissão após o presidente dizer em entrevista que estava "por aqui" com ele.A "caixa-preta" foi um dos temas dominantes na campanha de Bolsonaro. Para muitos apoiadores do presidente, a sua abertura teria potencial para revelar malfeitos maiores do que os descobertos pela Operação Lava Jato na Petrobrás.Logo após a vitória nas urnas, o presidente eleito se comprometeu a determinar, no início do mandato, "a abertura da 'caixa-preta' do BNDES e revelar ao povo brasileiro o que foi feito com seu dinheiro nos últimos anos".“Em temas delicados, espinhosos, que passaram por várias gestões, temos que ter responsabilidade e acuracidade. Temos pontos a melhorar, queremos ser mais ágil em prestar informações, mas sem abrir mão da acuracidade”, justificou.