Não há o que discutir, o público e o privado têm interesses opostos no mundo capitalista. Num país como o Brasil, com uma vastidão interiorana e rural significativa, a educação pública estatal não pode se furtar à formação de pessoas para o exercício da cidadania, a não ser que pretenda fragilizar-se. Os investimentos no setor, aplicados estrategicamente, devem preocupa-se com a geração de líderes comprometidas com a identidade nacional ou local de vida. E isso não faz parte do receituário neoliberal, muito pelo contrário.

A título de contextualização, esse receituário neoliberal sofreu um arrefecimento a partir de 2006, com a chamada “Crise do subprime”, alcançando seu auge em m 2008, ocasião em que os Estados Unidos viram sua economia desafiada por uma grave crise financeira, desencadeada a partir da quebra de instituições de crédito, as quais arrastando consigo vários bancos para uma situação de insolvência. Diga-se que essa crise, segundo muitos economistas, foi a mais grave desde 1929, até porque poderia transformar-se em sistêmica. Isso, entretanto, não significou desistência dos ideais neoliberais, apenas uma estratégica entrada em banho-maria, aguardando-se ocasião propícia para o ressurgimento.

Quando o Supremo Tribunal Federal, no dia 15 de abril de 2015, decidiu que o serviço público pode ser terceirizado em favor de organizações sociais (OS), eliminando a necessidade de concursos para hospitais e universidades, por exemplo. Essa decisão, fortalecendo o estado mínimo neoliberal, não foi tomada sem fundamentação legal.

Fazendo um retrospecto, em 15 de maio de 1998, o Governo Fernando Henrique (PSDB/SP), de cunho neoliberal, utilizou sua maioria no Congresso Nacional para aprovar a Lei nº 9637 que dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, as quais são evidenciadas como alternativa para a prestação de serviço público. Era a terceirização promovida pelo presidente neoliberal Fernando Henrique Cardoso. Aliás, o governador Marconi Perillo de Goiás (também do PSDB) pretende privatizar a educação pública do Estado via OSs. Em 2011, no mesmo Estado de Goiás, as principais unidades hospitalares foram repassadas para a administração dessas OSs. Agora seria a vez de repassar a administração de unidades educacionais estaduais para essas organizações. Outro ensaio terceirização se encontra na campanha promovida pela Rede Globo de Televisão: “Amigos da Escola”. Voluntários eram convocados para prestarem serviços nas escolas.

Outro antecedente da concretização das políticas neoliberais no Brasil foi Projeto de Lei, nº 4330/04, dispondo sobre os contratos de terceirização e as relações de trabalho deles decorrentes, de autoria do Dep. Sandro Mabel (PL/GO, na época) e cuja redação final foi votada e aprovada pela Câmara dos Deputados em abril de 2015.

Observe-se que esse processo de privatização já havia sido considerado pela Súmula 331/2011, de responsabilidade do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A diferença entre este documento jurídico e o Projeto de Lei do Dep. Sandro Mabel, aprovado em 2015, está no fato de que aquele restringia a terceirização à atividade meio, enquanto que este estende a terceirização à atividade fim.

Se o Projeto de Lei do Dep. Sandro Mabel for aprovado no Senado Federal, sancionado pela Presidente e, consequentemente, tornar-se Lei, o art. 205 da Constituição Federal sobreviverá? Uma organização social que tomasse conta da administração da Universidade Federal do Tocantins (UFT), por exemplo, teria interesse na manutenção de um Campus como o de Arraias, uma cidade de 10.000 habitantes?

Sem dúvidas, a terceirização, a ausência de concursos públicos, a administração pública via organizações sociais nos coloca diante de uma questão insana: possíveis aplicações da lei na gestão e docência das universidades públicas federais. Sem dúvida, um retrocesso para atender aos interesses do capitalismo neoliberal, da exclusão, do clientelismo e da manutenção de um sistema concentrador de rendas.