O Quartier Latin (bairro latino), tradicional reduto dos intelectuais franceses, é um famoso bairro de Paris onde se encontra a intelligentsia da França. Para lá, inúmeros intelectuais migram de todos os recantos do planeta à procura da necessária ambiência que dê vida a seus projetos.

Tudo isso se faz degustando um bom vinho, devidamente acompanhado de todo tipo de guloseimas que a rica culinária francesa oferta a turistas, estudantes e intelectuais que frequentam o mais famoso reduto dos intelectuais do país. Nos bistrôs do bairro latino, grande parte das obras de Jean Paul Sartre foi concebida ou imaginada. 

Não poderia existir melhor local para o exercício do ser intelectual.

A Universidade Sorbonne, os Jardins de Luxemburgo, as centenas de livrarias existentes no Quartier Latin e o fabuloso monumento aos grandes homens da França atraem escritores famosos ou aspirantes a escritores que lotam os restaurantes, bistrôs e, sobretudo, livrarias.

O peruano Mario Vargas Llosa, o colombiano Gabriel García Márquez, o mexicano Carlos Fuentes e o brasileiro Jorge Amado, sempre, mantiveram uma estreita ligação com bairro latino.

Nas inúmeras vezes que visitei Paris, mantive o hábito de percorrer as livrarias do bairro latino. Como é impossível ir a todas as livrarias do local, costumo frequentar a mais tradicional do Quartier Latin: a Gilbert Joseph, localizada no Boulevard Saint-Michel.

Mais que uma livraria, a Gilbert Joseph é um templo ao saber. Ela se espalha por os lados do tradicional Boulevard Saint-Michel. Literatura, ciências políticas, direito, economia, administração, relações internacionais, enfim, dependendo do interesse de cada um, a livraria atende aos milhares de clientes pelo mundo afora.

O nível dos funcionários que essa livraria coloca à disposição para ajudar na escolha das obras é extraordinário, e isso não apenas por saberem localizar os livros de nosso interesse, é mais do que isso, os funcionários da Gilbert Joseph se diferenciam pelo elevado nível cultural. Guardo na memória o nome da senhora Juliete, funcionária da livraria que me atendeu na última vez que visitei a Cidade Luz. 

Ela percebeu meu interesse por autores da literatura da América Latina e, com um sorriso no rosto, foi logo me interpelando:
̶  O senhor veio de onde?
̶  Do Brasil, respondi.
 ̶  Quais autores latino-americanos são de sua preferência?
 ̶  Da América Latina espanhola, interesso-me por Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa, Octavio Paz, Jorge Luis Borges e algo que não li e espero aprofundar: os contos de Júlio Cortázar. Do meu país, procuro pela tradução para o francês de “Grande Sertões Veredas”, de Guimarães Rosa, e “Dom Casmurro”, de Machado de Assis.
̶  Pois bem. Dê-me um tempinho? - solicitou Juliete.
̶  Todo o tempo que a senhora quiser. Tirei o dia só para comprar livros. 

Passados não mais do que vinte minutos, a simpática Juliete retorna e convida-me para entrar em uma sala repleta dos principais autores da América Latina. Percebi que existiam inúmeras outras salas próximas ao local onde eu me encontrava e fui logo indagando Juliette: 

 ̶  O que tem, Juliete, nessas outras salas?
 ̶  Cada sala dessa abriga obras de autores de inúmeras nacionalidades. Da África, Europa, Ásia e dos Estados Unidos. Os principais escritores da América Latina. 

Além dos autores já conhecidos, tive acesso não só aos escritores que solicitei, mas a outros autores até então por mim desconhecidos, como é o caso do escritor peruano José María Arguedas ou do uruguaio Juan Carlos Onetti. 
Inserido naquele ambiente reservado aos autores latino-americanos, adquiri as obras que estavam no meu planejamento, as outras obras, que estavam fora dos meus planos iniciais, comprei por sugestão da competentíssima Juliete, mais que uma vendedora, ela e seus inúmeros colegas, especialistas em literatura de outras regiões do mundo, conhecem profundamente a literatura de cada país.

Eles são a mola mestra de uma livraria globalizada e pronta para atender a um público altamente cosmopolita e informado que transita no Quartier Latin à procura de livros, ou até mesmo para um simples bate-papo que alimente sua incessante busca por mundos nunca dantes navegados. Mais do que uma livraria, a Gilbert Joseph é um culto ao saber.

Salatiel Soares Correia
é engenheiro, bacharel em Administração de Empresas, mestre em Energia pela Unicamp. É autor de oito livros relacionados às áreas de Energia, Política, Economia e Desenvolvimento Regional.